Destilo aqui a dor, o delírio, a desventura e a delícia dos meus dias em palavras. Destile, você, essas palavras em algo que te compraza.
sábado, 26 de janeiro de 2013
Das Diferentes Solidões.
Era quinta-feira quando a solidão caiu pesada sobre o telhado do quinto andar do prédio de esquina. O apartamento, muito cheio de luzes, foi esfriando ao som de uma valsa estranha que tamborilava serena junto com a chuva. Algumas cartas ainda estavam espalhadas sobre a mesa da sala, algumas garrafas cheias e um som estranho a ele, que ainda dormia sobre os lençóis da semana passada: silêncio. Era domingo quando ela descobriu que não fizera nada o fim de semana todo. Apressada, ela correu pela sala e agarrou o telefone com o desespero de um náufrago e discou, quase a esmo, navegando chamada pós chamada, por uma mar de amigos ocupados, de reuniões na segunda, aulas de dança de salão... Até que um "não", mal educado, perfurou a sua angústia e deixou-a tonta, ali sentada, enquanto a irmã menor ajudava a mãe a preparar o jantar dançando mambo. Era madrugada de um sábado quando elas saíram da boate, insatisfeitas, sugerindo uma para a outra esses mistérios que as mulheres imaturas demais para falar usam para esconder intenções assassinas. Não era bem traição, eles não estavam mais juntos, mas ele não deveria se recuperar tão rápido do término do namoro. Ela mal tinha beijado outros caras, era tão injusto... E o motorista quase dormia sobre o volante do taxi, acordando completamente quando a salsa esquisita do rádio trovejava um tambor qualquer. Era manhã de uma terça-feira ensolarada, dessas que fazem os olhos arderem, quando ele pisou o gramado verde. Tinha um ramalhete nas mãos, meia dúzia de flores que não significavam absolutamente nada para ele. Ele era muito novo pra entender aquele gesto tão repetido, tão significativo. Acompanhado, ele chegou ao local, abaixou-se e depositou as flores sobre a placa de granito recém colocada - fria como a morte - e saiu sem olhar. Alguma coisa nele doía enquanto voltavam pra casa. Um vazio, ou qualquer falta, sentado no banco de trás, quando um bolero antigo que ele conhecia começou a tocar no CD player. Ele quase não viu uma lágrima pelo retrovisor enquanto sua mãe disse: "Esse é de quando seu pai e eu nos conhecemos." Ele quase não sentiu que estava vivo, até que fosse obrigado a descer. Dessa vez sem ajuda. Sozinho.
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