sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Balada dos 20.

E eu acabei descobrindo que nada: Nada é mais caro no mundo que o abraço de quem te ama, aquele beijo esquecido no fundo de uma gaveta ou o céu estrelado em cima da sua casa. Nada é mais estranho que gosto de saudade, lichia verde e querer que a noite nunca acabe enquanto o sol já vai nascendo. Nada é tão certo como um sorriso apaixonado, meia dúzia de palavras bobas ou dois amigos reunidos em torno de uma garrafa de qualquer coisa. Nada é tão longo como tempo passado longe de quem se gosta, caminho de volta pra casa ou agonia de dia seguinte. Nada assusta mais que redescobrir velhas paixões, se descobrir em outra cidade ou encontrar gente capaz de te descobrir. Nada é tão irônico quanto o passado comparado ao presente, tão vivo como a ferida causada por palavras ou tão entorpecente quanto amor platônico. Nada é tão velho quanto aquilo que nasceu um dia depois de você, tão nobre quanto as suas intenções ou tão risível quanto os pretextos que você chama de motivos. Nada é tão soberbo quanto reconhecimento alheio, tão bestial quanto desejo reprimido ou tão mudo quanto 20 andares de elevador. Nada é mais bem vindo que ligação de gente conhecida, encontro casual ou trama bem sucedida. Nada é tão bonito quanto o seu mau gosto, tão interessante quanto a vida alheia, tão inútil como as horas da tarde de segunda feira. Nada é tão doce como leite condensado, olhar de cachorro cansado ou sorvete roubado no inverno. Nada é mais excitante que pele coberta, que porta entreaberta, que aquilo que é proibido. Nada volta mais rápido que mal feito a outros, que ônibus errado ou aquelas coisas ou pessoas que foram embora dizendo que não voltariam. Nada voa mais rápido que palavra dita, que carnaval entre amigos e noite entre taças de vinho. Nada comove mais que vontade sussurrada, que cachorro abandonado, que noivo abandonado. Nada é mais engraçado que você mesmo acordando, que palhaço sem maquiagem, que tombo de amigo ou noite bêbada. Nada coça mais que sentimento de culpa, risada sufocada ou raiva presa. Nada vale mais a pena que dizer a verdade a quem se ama, que correr a tarde toda contra o vento ou assustar seu cachorro. Nada te atrapalha mais que cultivar seu orgulho, desligar o celular e se fazer de desentendido. Nada ofende mais que ser ignorado, que perceber a pena alheia, que ser bem interpretado até de mais. Nada humaniza mais que brigar pelo último pedaço de pizza, que dar esse último e suado pedaço a um cão faminto, a uma pessoa faminta. Nada cura mais que tempo, dói mais que mertiolate e queima mais que brigadeiro que espirra. Nada vai te fazer mais forte que cada fracasso, cada dor, cada passo em falso. Nada vai te absolver até você ser capaz de perdoar os seus pecados. Nada vai acontecer até você fazer acontecer. Nada vai ser do jeito que você gosta até que você mesmo o faça. E ninguém vai, nunca, ser perfeito. Descobri, na verdade, que o motivo das pessoas felizes está mesmo em se apaixonar por cada dia, cada pessoa, cada desejo, a cada nova hora. Faça até mesmo o miojo de quinta feira com paixão. Coloque mais interesse nos seus olhos e perceba o quanto a vida é apaixonante, mesmo que com percalços. Aceite as paixões dos outros, respeite as paixões dos outros, você não é nada mais que um verme diante da paixão alheia. Viva e deixe que vivam. Seja apático com defeitos e ressalte qualidades. Mas, acima de tudo, tenha paixão: Respeite e cultive as suas paixões. Deixe-se perder, deixe-se consumir, deixe-se rir, deixe-se calar. Permita-se, por favor... Apaixone-se. Ou você não saberá fazê-lo quando apaixonarem-se por você.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

É vontade.

Coisa ingrata é a vontade. Ela se infiltra no meio da tarde ensolarada, se esconde lívida de desejo, retorcendo as mãos, em uma caneca de café qualquer e espera. Espera calada, jogada no fundo turvo e líquido. Coisa calma é a vontade, com seus longos dedos cheirando perfume antigo e seu abraço frio, esperando o dia em que será satisfeita em sua fome. Coisa vadia é a vontade. Gato preto arranhando muralhas na esperança de transpor qualquer sonho tolo, lambendo muralhas inteiras construídas com o apreço mudo de quem já sofreu as perdas do amor. Coisa insolente é a vontade, olhando a temperança com o desdém de quem já leu Dostoievski e uma taça de Bourbon fumegando desejo entre os dedos. Coisa atemporal é a vontade, com suas roupas corroídas e olhos vivos, escorrendo decadentes pelas horas ínsones da madrugada de domingo. Coisa engraçada é a vontade, girando incômoda no estômago enquanto o desejo ri, numa ciranda descontrolada, desnuda de qualquer limite ou moral. Coisa assassina é a vontade, apertando a garganta, estremecendo as mãos, sufocando a voz. Coisa insana é a vontade, se dobrando em mesuras arcaicas pra quem não merece, esquartejando verbos imperativos ao sabor do humor acidental de uma taça de vodka. Coisa solitária é a vontade. Dançando sozinha pela sala vazia, olhando os cômodos da casa sem paixão, riscando com giz branco o negro-insônia da noite. Coisa arrogante é a vontade. Superiora de todas as gárgulas, cavalgando a racionalidade, puxando as rédeas pra mais perto do abismo. Coisa rascante é a vontade, descendo a seco na garganta quando a noite acaba sem pecados a redimir, secando a boca e arrepiando a pele. Coisa veemente é a vontade, gritando soberba em meio à multidão vaporosa de vozes, se fazendo ouvir entre o freio da razão e a lâmina da loucura. Coisa desnecessária é a vontade, sangrando um milhão de novos motivos todos sem sequer razão de ser, sem necessidade, sem mais precisão, sem possibilidade... Arrastando as correntes molhadas de lágrimas, chorando poças inteiras de pura calamidade. Coisa fria é a vontade, congelando as lágrimas, marcando os passos no chão esbranquiçado, azulando o outrora vermelho dos lábios, dos olhos, da tarde. Coisa indecifrável é a vontade: Revivendo na morte, agradecendo a saudade, congelando entre chamas, calma em meio à desgraça, cada dia mais divina, cada dia mais digna do homem.

sábado, 8 de outubro de 2011

Quando as lembranças amarelaram, até as melhores, sobra espaço pra olhar as fotos e rir sem problemas. Bom mesmo é não sentir raiva, nem saudade: Só essa fina certeza de que é passado bem enterrado.
Sou amigo dos meus amigos, mas nada supera minha generosidade com meus inimigos: Dou-lhes, todos os dias, um motivo novo pra que falem mal de mim.