Descobertas são sempre traumáticas, se são a respeito de si
mesmo, então, pior ainda. Eu escolhi me alienar das crises alheias e me render
a esse atraente direito de ser irracional. Pus as razões dos outros de lado e
me permiti submergir em uma crise, dessas que se encurvam sob o peso da água
quente debaixo do chuveiro. Essas tardes de sexta, que exigem aos gritos um
pouco de insensatez que esverdeie o céu azul, trazem um pouco de compreensão,
só o suficiente para que você perceba... Sozinho, à deriva, numa rua cheia de
pessoas que olham seus passos pretensiosos em direção ao nada, você anda com a
suavidade de uma estátua. Descrevendo passos que mesmo sem destino, continuam
preocupados, altivos, coléricos. Acostumado ao grilhão acobreado da pressa,
prefere se agarrar com força aos ponteiros de um relógio qualquer pra que não
perca o medo de se atrasar que tanto preza. Essa necessidade da pressão que
impulsiona talvez seja o açoite da minha vontade bem cortada e costurada aos
interesses, deveres e rotinas da praxe sobre a carne dura e negra dos meus
desejos que queimam sem cessar. Mas uma tarde, as companhias se tornam garrafa vazia
e uma nova necessidade cresce viçosa: solitude e privação inauguram o deserto
que eu criei para o meu jejum. E você se deixa sentir coisas que sequer
percebia que podia sentir. Saudade de amigos, de vozes, de cheiros, de toques e
risos. Vontade de correr com vento lambendo o rosto, um abraço esquecido, um
suspiro inaudível... Despercebidas, essas vontades permeiam o curso das horas,
dando o sabor amargo que os dias prescindem. E de repente, descobre uma
necessidade louca de permissividade: Quem nunca se permite sentir o que não
quer, não compreende os próprios desejos, não perdoa os deslizes sem culpas
desnecessárias e não saberá o gosto surreal de uma manhã de domingo
despreocupada e lúcida. E se cansa das insistências, das tentativas toscas e
aprende a sorrir, mesmo frente ao abismo mais profundo. Aprende a se permitir.
Aprende a se perdoar e a sorrir, mesmo quando o abismo fica dentro de você.
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