“Nobody
raise your voices, just another night in Nantes” Nantes- Beirut
O aperto no peito era a zabumba que ritmava os pequeninos
escravos retesando os músculos que me faziam andar. Andar é obrigatório,
continuar sempre em frente na senda dolorida das horas de sol a pino e calor
belo-horizontino. E como doem as gotas de suor escorrendo pulso adentro! Para
um aiuruocano de má veia como eu, ensinado no frio altivo das montanhas, calor
é tortura e gente é dispensável. Nunca gostei de muita gente por perto: a sina
das cidades pequenas com suas ruas vazias de gente e lotadas de olhares: As
janelas antigas, abertas como grandes olhos verdes, azuis, transparentes como o
gelo novo, mirando o futuro com a impassibilidade de uma vaca gorda e
satisfeita em seu espírito: Desdém e frieza surpreendentemente bem educados. A
impassibilidade de quem sorri de lado, tão soturno quanto a lua de verão,
escondida entre as nuvens que ameaçam mais uma chuva: Sorriso que não deixa
transparecer por trás dos dentes cerrados, a desimportância das horas, as
palavras muito afiadas e o interesse educado que, forjado ao bom gosto das
famílias da tradição, enche as salas de cochicho. As boas famílias, redutos da
antiga praxe e dos costumes que cheiram bolo quente, biscoito de polvilho, casa
lotada, toalha de renda e fofoca. Educado como fui, nunca fui dado a confissões,
lamúrias ou pedidos, dada a natureza rebaixada desses sentimentos, mas confesso
que sinto saudades da minha Aiuruoca. Não repare o sorriso obtuso, os
movimentos lentos, o capricho com a palavra e o gosto afiado, exigente e por
vezes rústico. A minha cidade tem paralelepípedos mais negros que a noite, e
nesse negrume, estão escritos os anais de todas as gerações, agudos, abusivos,
absurdamente secretos. Eles me ensinaram a não dizer, não desdizer, a
transparecer sem perecer uma só significância. Ensinaram-me a ser um bocadinho
mais pedra, mais ferro, menos maleabilidade - tão metropolitana. Interiorano
como sou, com sotaque cheirando a mato e olhos que não se cansam de mirar o
céu, eu traço meus próprios caminhos vermelhos de terra sobre o chão duro da
Cidade de Minas. E não me cabe o cansaço, a desistência, a divagação: Eu não
seria aiuruocano se me entregasse. E só pra que se saiba, não que eu queira me
gabar, mas Aiuruoca é muito mais que cidadezinha interiorana. Ela é um vício,
um signo, um estilo, uma chama antiga e alta, ardendo as bandagens da juventude
sorridente. As Itabiras e Drummonds que me perdoem, Aiuruoca sempre foi muito mais.
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