Destilo aqui a dor, o delírio, a desventura e a delícia dos meus dias em palavras. Destile, você, essas palavras em algo que te compraza.
segunda-feira, 28 de março de 2011
Ego.
Descrevo-me basicamente como um detalhista distraído. Sobre essa minha inadvertência... Já me causou maus momentos. Sou muito capaz de passar por você numa rua vazia e bem iluminada, te olhar nos olhos como se nada mais existisse e seguir incólume sem nem mesmo te dar um “oi” [eu geralmente ”olho mas não vejo”]. Perdi a conta das vezes que passei por um amigo e dez passos depois reconheci o sujeito, parei, olhei pra trás e lá estava um rosto com aquela cara de “você me ignorou?” estampada. Já deixei de cumprimentar parentes em supermercados por pura distração enquanto eu escolhia o produto certo. Sem contar os momentos com fones de ouvido, que lançam minha mente na inércia e não me permitem nem a consciência de onde eu estou. Amo os detalhes, e embora minha recorrente falta de atenção muitas vezes os esconda de mim, eu os persigo. Posso me deter por horas pensando nas razões de um sorriso quase imperceptível, sufocado no canto dos lábios ou na expressão dos olhos curiosos de um desconhecido. Não gosto que detalhes me escapem. Ah, sim, eu noto. Quando minha atenção rota se foca em algo, ou alguém, reviso, percebo, analiso. Extrapolo o olhar velado para uma cuidadosa e insana metodologia científica. Gosto de descobrir sutilezas: um olhar estranhamente recorrente ou um perfume particularmente bom. Ah, detalhes, como me marcam! Não me lembro da maioria das festas às quais fui, mas lembro nitidamente de cada sorriso, vontade, olhar. E nessa profusão de detalhes eu acabo perdendo o todo. Recortando sorrisos estonteantes de rostos que eu acabo por não reconhecer no acender das luzes. Vasculhando desesperadamente minhas gavetas, procurando o restante daquele rosto mas só o sorriso realmente ficou gravado. Eu me distraí apreciando, em êxtase, o sorriso e desprezei o rosto. E nesse mundo tão meu e tão pouco sóbrio eu continuo... A minha distração me atiça para os detalhes, e eles me jogam de volta na distração. Assim, nesse círculo que não me cansa nem um pouco eu sigo distraído, mas atento aos detalhes, sempre.
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