Meu doce, perfeito, maior e eterno amor, avise-me quando morrer, pois quero eu mesmo postar no jornal mais renomado a tua nota de falecimento. Deus me livre dos amores ternos, dos amores trôpegos. Pois deles é o reino do céus. Na terra se vivem amores loucos, amores bêbados, que do transe de uma noite nascem e renascem de cinzas ou chamas, cada dia mais fortes, cada dia mais loucos. Deus me livre dos amores estáticos, dos amores constantes, que dormem a sono solto sobre a grama muito verde, pois essas estátuas nada podem gerar. Deus me livre dos amores certos, cortados ao gosto das boas famílias, pois seus frutos serão tão monótonos quanto quem os criou. Deus me livre do amor fácil, perdido no chão dos salões, a vida lhes reservou o chão por um bom motivo. Deus me livre dos amores esguios e fugidios do andar pelas ruas, pois no frio das ruas começam e na pressa das ruas terminarão. Deus me livre dos amores calmos, pois de todas as piores lutas, a mais cruel é travada em silêncio. Deus me livre do amor infantil, que não sabe sofrer. Deus me livre do amor servil que, distante, escreve declarações a sangue. Deus me livre do amor cego, que não percebe distâncias impostas, sorrisos forçados. Deus me livre do amor eterno, que de todos os piores defeitos possui a jóia mais perversa: o que é eterno, o que é perfeito, jamais se renovará. Deus me livre desses amores, pois deles é o favor dos anjos. Aqui onde vivo, onde não chega a voz das deusas, se vivem amores que choram, que ardem, que correm, que minguam de tanto desejo, que se desvanecem, que beijam, que queimam , que sofrem, que fingem e que odeiam. Livra-me Deus, desses amores divinos que sob nada se pervertem, pois são tão divinos, que não são humanos e não habitam entre os homens. Livra-me Deus, pois sou ciente que, talvez, dos teus melhores presentes o mais doce seja a fraqueza da carne, que me faz humano, que me faz errante, que me faz incorrigivelmente e inevitavelmente, amante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário